terça-feira, 20 de dezembro de 2011

DIÁRIO DE VIAGEM: CHEGANDO NA MONGOLIA...


Eu estava devendo minha viagem para a Mongólia há muito tempo... finalmente, tomei uma atitude! Aqui vai um breve "diário" da visita ao templo Gandam em Ulaan Baatar...

... Chegamos em Ulaan Baatar por volta das 6.30. Já estava claro, e pôde observar, pela janela do avião, o lugar onde estávamos aterrissando. Pelo que constatei, a Mongólia, vista de cima, é uma terra verde e marrom, praticamente sem vegetação alta, ondulada.
Aqui e acolá, formas redondas, brancas: são as geer, ou yurtas, as tendas dos nômades. Aterrissamos nessa paisagem insólita e demoramos um pouco para sairmos do aeroporto, pois precisávamos esperar a emissão do visto.
Agora o visto no meu passaporte ocupa uma página inteira, e não consigo deixar de olha-lo: me sinto uma Marco Polo do século XXI, aqui, na terra de Gengis Khan, nossa, uma viagem que sonhei por tanto tempo!
Na saída, nossa guia estava nos esperando, uma moça muito jovem, que fala um pouco de italiano.
Do aeroporto até a cidade andamos um bocado, ladeando o nada da terra, vazia de um lado, com as grandes centrais elétricas do outro... tudo como nas minhas viagens imaginárias, tudo como nas imagens que criei em minha cabeça!
Descansamos, pois afinal, o vôo Moscou Ulaan Baatar demorou a noite inteira.
Na parte da tarde, fomos visitar um pouco de cidade.
A primeira parada foi o Gandam, um complexo enorme de templos e mosteiros budistas, talvez o maior do país.
Amei as suas edificações, assim como amei virar os cilindros do karma, assim como amei a gigantesca estátua do Buda e os estupas em volta do templo.
Um grupo de monges estava armando uma geer colorida, e vi como se constrói do começo ao fim.
Quando acabaram, deixaram a gente entrar...

GALÁPAGOS: A ILHA RÁBIDA...


Do meu diário de viagem nas Galápagos:
24 de Dezembro.

... A tarde foi de praia, na pequena ilha Rábida, vermelha pelos minérios de ferro, tanto na aréia, como na parte mais afastada da orla. Passamos ao lado de uma pequena lagoa salgada, onde os leões marinhos mais velhos e aqueles muito novos, aqueles leões marinhos que não são machos alpha, ficam para se recuperar das feridas de suas batalhas perdidas pela conquista das fêmeas. Passeamos no alto da ilha, cuja vegetação, extremamente seca, aguarda a estação da chuva, já prestes a começar. Os cactos são, aqui, uma variedade com espinhos macios, pois não há inimigos naturais dos quais se defenderem. Realmente, não espanta que Darwin tenha encontrado, nessas ilhas, o santuário de sua teoria. Com efeito, nas outras ilhas do arquipélago, lá onde se encontram as iguanas de terra, os cactos têm espinhos defensivos, pois esses estranhos répteis se alimentam deles.
Do alto de um rochedo, íngreme sobre a água do mar, a água é tão transparente que se vêem os peixes nadando, lá em baixo, distantes, listrados, coloridos, os peixes anjos.
Alguns caranguejos brilhantes, vermelhos alaranjados, estavam imóveis em uma fenda, perto de uma iguana marinha. Somente na ilha de Espanhola as iguanas marinhas são rosadas, por causa das algas que lá se encontram. No restante das ilhas do arquipélago elas são pretas ou cinza chumbo.
Sentei na praia, depois de andar ao longo das ondas, até o final dos rochedos, sempre no meio dos leões marinhos.
Areia vermelha, conchas brilhantes e um filhote de otária seguindo a mãe, tão recém nascido que ainda tinha o cordão umbilical pendurado na barriguinha.
Voltamos ao navio no final da tarde e, da sacada da cabine, vi a ilha de Rábida desaparecer em um por do sol vermelho dourado...

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

TODOS SE PERGUNTAM...E EU TAMBÉM!


Então, não que o que vou escrever seja novidade, é que até hoje ninguém me respondeu direito... e vez ou outra, fico encanada com essas coisas. Coisas tipo lembrar de todos os nomes dos sete anões de Branca de Neve. Vejam bem, é uma questão importante... para lembra-los, encontrei um jeito, o de botar cada anão em um dia da semana. Ainda assim, em geral consigo lembrar somente de seis deles, e demoro para recuperar o sétimo lá na memória. Enfim, eu sou uma pessoa que tem perguntas. Várias. São questões que, às vezes, adquirem uma certa relevância. Ou não? De qualquer maneira, aqui vão minhas sete perguntas, uma pergunta para cada anão...
1) Dúvida clássica: por que o cachorro do Pateta não fala e o Pateta sim? Como eu acho que o Pateta é usuário de maconha & alucinógenos, será que isso tem a ver com a evolução diferente? Pior que o Salsicha e o ScoobyDoo?
2) De quem são filhos o três sobrinhos do Pato Donald? Ele tinha um(a) irmã(o) que morreu em algum acidente de carro? E no carro onde os pais dos três morreram, estavam também os pais do Pato Donald, que também morreram?
3) A Margarida é prima do Pato Donald? Pergunto, pois ela também é sobrinha do Tio Patinhas... nesse caso, se é prima, não é meio incestuosa, a relação entre ela e o Pato Donald?
4) Tio Patinhas é irmão da Vovó?
5) O cavalo Horácio e a vaca Clarabela são casados. Se tiverem filhos, o que vai nascer?
6) Peninha, além de maconheiro, é gay?
7) Por que não existem patos pretos em patópolis?
Acho que todos nós, em algum momento, tivemos essas dúvidas....





quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

CRUZAMENTOS SEM MEMÓRIA.


Em Black Stream estamos bem no meio do "paradoxo da falta de senso de noção". É um lugar onde vale tudo, e nada faz muito sentido.
Por exemplo...
Por exemplo:
Todo mundo que já não digo estudou, mas assistiu o Jornal Nacional em algum momento de sua vida no dia 9 de julho sabe que no Estado de São Paulo é feriado.
Talvez também saiba porque.
É feriado pela mesma razão pela qual em Capital City (melhor conhecida como A CAPITAL do homônimo estado) NÃO existe uma rua/avenida/praça intitulada a Getúlio Vargas.
É ÓBVIO: você não comemora o dia 9 de julho e, ao mesmo tempo, o cara contra o qual você lutou exatamente no dia 9 de julho. Capital City escolheu lembrar de que lado esteve na época da Revolução de 1932.
Pois bem...
Pois bem:
Como demonstração de que falar em memória (pior, em MEMÓRIA HISTÓRICA) na latitude de Black Stream é, evidentemente, um mero exercício escolar, de que não passa de uma chatice curricular que não interessa a NINGUÉM, apresento, aqui, O CRUZAMENTO SEM NOÇÃO:
Em Black Stream.
Existe.
Um cruzamento.
Que faz.
O SENTIDO pirar:
a avenida NOVE DE JULHO cruza com
a avenida GETÚLIO VARGAS.
Assim, lembramos de todos sem escolher ninguém.
Que significa que não lembramos de nada e de ninguém.
Assim, todo mundo fica feliz, o passado não revela seus conflitos, ninguém vê, ninguém pergunta, e tudo, tudo mesmo pode ser esquecido...
Francamente, não que eu ligue: essa história não me pertence. Só achei curioso que não pertença também aqueles aos quais deveria pertencer...

terça-feira, 29 de novembro de 2011

A DESELEGÂNCIA DESSAS JÓIAS...

Essa publicidade me foi assinalada por uma aluna, e achei por bem publica-la aqui, para "documentar" que as minhas não são as viagens de uma mulher histérica e infeliz, obcecada por absurdas manias de perseguição, que se engana em ver esse mundo como pouco acolhedor para com as mulheres.
O anúncio possui também uma escrita que acompanha a imagem, que diz que foi "inventado o primeiro controle remoto para as mulheres".
Basicamente, se trata de uma publicidade extremamente vulgar, cuja mensagem é mais que óbvia: dê uma jóia de presente para uma mulher e ela... automaticamente "abrirá as pernas".
E depois tem gente achando que sou eu que vejo machismo em tudo!

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

CAIO MACHÃO CASTRO???

Premito que não assisto novela, falta-me paciência e interesse.
Porém:
leio as notícias.
Assim foi hoje, quando me deparei com as afirmações desse representativo das "tendências atuais". Que significa: assim que lhe falaram que foi politicamente incorreto, pediu desculpas, mas não tenham dúvidas, para ele, é melhor "pegador do que veado".
Que seja. A fala, em si, é fortemente preconceituosa, mas já sabemos que na terra dos machos é também fácil ouvir coisas como "melhor um filho ladrão do que veado".
Os gays que se cuidem.
Minha questão é outra. Nesse requintado (ou requentado???) linguajar, todo mundo aceita o termo "pegador" sem qualquer problema. Aliás, pelos comentários postados pelos leitores da Folha no final da notícia, é motivo de orgulho profundo "pegar" as mulheres.
As quais, nessa lógica, não passam de presas passivas. Eu pego o ônibus. Pego o carro. Pego as chaves de casa. Pego COISAS e não pessoas.
Nessa violência da linguagem, está embutido o direito de estupro.
Só pra constar...

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

MULHERES QUE ODEIAM AS MULHERES???


Uma das coisas que mais me incomodam são as mulheres assumindo tons e posturas machistas. Mulheres que falam de mulheres como se elas não pertencessem ao mesmo gênero. Comentários como "não dá para confiar nas mulheres", ou como "mulheres são mais traiçoeiras"que os homens são bem comuns, entre milhares de outros que não vou nem me dar ao trabalho de colocar aqui. Acredito que bem os conhecemos. Mulheres são fofoqueira. Mulheres sofrem de TPM. Mulheres são umas cobras. Mulheres são levianas. Mulheres só gostam de gastar em shopping. Mulheres só correm atrás de carteiras cheias. Mulheres são isso, mulheres são aquilo e, no final das contas, somando tudo, são a pior criatura que já ocupou esse mundo. E até aí, não me espanta que homens, padres, pastores, enfim, os legítimos detentores dos valores patriarcais e religiosos se expressem seguindo essa tradição misógina e muito estúpida.
O que me deixa sempre muito perplexa é quando as mulheres fazem essas mesmas afirmações. Quando são vozes femininas que se expressam dessa maneira. Aí, eu paro e pergunto: essas mulheres que afirmam a ruindade das mulheres, será que não percebem que elas próprias estão incluídas em sua própria fala? Será que não percebem que uma mulher que afirma que as mulheres são todas umas vadias está falando isso de si mesma?
Depois, me pergunto também se percebem que falando isso na frente dos homens só estão abrindo caminhos para que eles atirem com mais violência suas palavras contra as mulheres e, pior de tudo, talvez não percebam que, fazendo isso, denegrindo a si mesmas, não vão por isso ser melhor consideradas por eles.
Não se ganha nada, assumindo discursos como esses, nem perante as outras mulheres, nem aos olhos dos machos.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

UM CONTO DE FADAS & LIVROS

Uma leitura em que a liberdade anárquica de um leitor se torna defesa assassina do objeto dessa liberdade, o livro, se encontra em uma das muitas histórias que se entrelaçam no romance Storia di Neve, de Mário Corona (2007). A jovem Neve, protagonista do romance, gosta de passear pelo bosque onde os lenhadores “fazem a madeira e os machados cantarem”, e ela gosta desses sons. Entre os lenhadores, ela é amiga do velho Lídio que, durante as pausas do trabalho, costuma ler um livro. Neve fica curiosa e, um dia, pergunta-lhe de que livro se trata, inclusive porque “de tanto manuseá-lo, as páginas mal ficavam ainda juntas” (CORONA, 2007, p. 483). O velho responde que ele não sabe, pois nunca aprendeu a ler. Neve pergunta, então, como ele pode ler se não aprendeu a ler, e Lídio revela uma perspectiva interessante sobre a liberdade do leitor que o livro proporciona:

Eu não sei nem ler nem escrever, mas quando olho para as páginas desse livro histórias, muitas histórias me vêm à cabeça, uma apos a outra, e as conto para mim mesmo, assim é como se estivesse lendo o livro. Acredito que o livro contenha uma única história, mas eu invento muitas olhando para as páginas, e são histórias bonitas, se eu soubesse escrever as escreveria, mas um dia vou contar umas para você. ( Ibidem, p. 484).

Neve pergunta para Lídio se ele consegue inventar histórias sem olhar para o livro, mas ele responde que não, sem abrir as páginas não nascem, são as páginas que as despertam, e assim “... você vê que, na prática, leio histórias sem saber ler” (Ibidem, p. 484).

Curiosa, Neve pede ao velho o livro emprestado e vê tratar-se de Os Noivos, de Alessandro Manzoni, que ela nunca lera. Neve propõe ao velho a leitura do romance e, no começo, somente Lídio parava para ouvir mas, em poucos dias, todos os lenhadores se aproximaram para ouvir a leitura, para escutar a narrativa das desventuras de Renzo e Luzia. O fim da leitura do livro provoca, em todos esses leitores ouvintes, um sentimento de tristeza. O mais triste de todos, porém, é o próprio Lídio, porque, explica,

[...] agora já conheço a história de meu livro, e quando viro as páginas elas não me dizem mais nada. As páginas não me contam mais histórias, não me deixam mais inventar histórias para mim. A única história que me contam é aquela que você leu, mas essa eu agora já conheço. Preciso encontrar um outro livro, que eu não sei o que tem dentro, e então, talvez, as histórias voltem. (Ibidem, p. 485).

Neve resolve presenteá-lo com seu livro de gramática, e não lê sequer uma linha para Lídio, que volta a “inventar” (de inventio = encontrar) as histórias nas páginas. Dois anos mais tarde, Lídio se apresenta ao padre da aldeia, dom Chino, que se maravilha pelo aparecimento do velho, pois esse costumava rezar somente nos bosques e não freqüentava a igreja. Ainda por cima, lia e relia o mesmo livro sem saber nem ler nem escrever. Anteriormente, Lídio visitara Neve e deixara-lhe de presente Os Noivos. O velho quer se confessar, mas “de homem para homem”, olhando nos olhos de dom Chino. Se confessa, assim, com uma garrafa e dois copos de vinho na mesa, assumindo a culpa de ter matado um homem. A razão de seu homicídio reside no livro que esse homem roubou dele, o mesmo que Neve lhe dera. Quando Lídio pediu ao homem que o devolvesse, esse o ignorou. Tomado por um raptus, Lídio cravou-lhe a foice no peito, pois o homem mentira, dizendo-lhe que queimara o livro. Lídio, com efeito, não acredita e, depois de matar, procura e encontra o livro, que leva, manchando sua capa com o sangue.

Agora, cheio de remorsos, resolveu confessar e ir embora. Com efeito, depois da confissão, Lídio desaparece da aldeia, sem deixar vestígios. Muito tempo depois, será a própria Neve que encontrará um esqueleto. Ela mesma o identifica como os restos de Lídio, graças a uma lata selada ao lado dos ossos, que contem, entre outros objetos, o livro que Neve lhe dera e com o qual será enterrado.

domingo, 20 de novembro de 2011

QUEM PODE, PODE...


Quem pode o que, nesse mundo?
Hoje li a notícia de um jornal italiano que um homem de 76 anos foi morto por um SUV, depois de uma briga. O SUV estava estacionado em lugar reservado aos deficientes físico, e a esposa do morto, deficiente física, se encontrou despojada de seu direito. O marido brigou e o dono do SUV (cada vez mais tenho a sensação de que donos de SUV se acham donos do mundo também) o atropelou e fugiu.
Li, também, a notícia de um juiz que expulsou do tribunal uma tradutora árabe, por usar lenço. O mesmo juiz duvido que teria expulsado uma freira, ou uma mulher que usasse lenço porque, sei lá, está cobrindo a cabeça por fazer quimioterapia.
Para se ter direitos no mundo, a receita é simples e antiga:
1) Ser homem., branco, ocidental, hétero-sexual.
2) Ser rico.
3) Não ter mais de 50 anos.
O resto só está a disposição dele.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

JÁ PARARAM PARA PENSAR?

Escrever é uma fala diferente, mediada pelo registro que a sustenta, que pode permanecer para leitores futuros. No caso de uma produção que busca uma publicação, é uma escrita que desafia os limites do círculo íntimo de parentes e amigos, é um gesto cheio de ambição e de exercício de poder, pois significa colocar-se no centro do mundo e deste lugar falar. Gesto ousado e até tempos relativamente recentes, negado às mulheres, às quais fora ensinado a se colocar de lado, a não tomar a palavra, a ser modestas e obedientes. As mulheres tiveram que conquistar o direito de publicação.

A publicação de um livro coloca a mulher, como indivíduo, no espaço público. Este transforma suas escolhas em atos documentados pelas próprias palavras, na medida em que se considera o papel de um indivíduo em sua esfera de ação pública.

No século XVII, publicação significa, para as mulheres, se tornar de “domínio público”, ultrapassar os limites da esfera doméstica à qual eram confinadas quando “honestas”, arruinando suas reputações; ainda vigorava o princípio de um conflito entre seus papeis privados e públicos. Virginia Woolf em A room of her own, traça o retrato de uma famosa erudita inglesa, Margaret Cavendish: tamanha era a vontade dela de escrever, que foi condenada à solidão pelos seus contemporâneos. É uma escritora que escreve sem público e sem critica, e quando sai na carruagem, as pessoas observam-na boquiabertas, como uma freak de circo. Ela encarna a perda dos valores cultuados pelas moças honestas e modestas. É sempre Virginia Woolf que fala da trajetória de Aphra Behn, a primeira escritora profissional reconhecida na Inglaterra. Para Virginia, a independência econômica – que Aphra alcançou – é a base de todas as outras liberdades; todavia, ainda por longo tempo, as mulheres que quisessem se tornar economicamente independentes através do exercício da escrita – e da publicação -, teriam que assumir uma identidade de mulher pública associada à prostituição, pois ousam se expor, tomar a palavra e, enfim, ganhar dinheiro com isso, postura lamentável, na época.

O direito a uma escrita pública, parcialmente alcançado no século XVIII, encontrou novos obstáculos no século XIX, com o florescer de teorias “científicas” sobre a incapacidade feminina de criação intelectual – o antigo logos, território masculino da esfera pública, em sua face moderna, continua exclusivo. No século XVIII encontra-se uma mudança na definição das relações sociais. Rousseau põe o problema do governo baseando-o no conceito de economia não mais entendida como mera gestão dos bens particulares por parte do pai, mas ampliando o sentido da palavra para o de “Economia Política”. A população passa a ser concebida, então, como sujeito de necessidades, como finalidade do governo, e não mais como a potência do soberano. Nesse quadro, passa a ser também o objeto sobre o qual trabalhar “publicamente” em termos de saber.

A “teoria contratual”, base da sociedade moderna – e contemporânea -, apresenta, mais uma vez, o problema da exclusão das mulheres. Conforme tal teoria, um dos alicerces da revolução francesa, as relações entre os homens são definidas por um plano “horizontal”, ou seja: os membros da sociedade podem estipular contratos com base paritária (a egalité revolucionária), de forma livre. A questão surge com a fraternité: este termo não define a totalidade do corpo social, incluindo somente o gênero masculino. Poderia aparecer uma sutileza retórica argumentar sobre a Declaração Universal dos direitos dos cidadãos. Todavia, a discussão sobre as cidadãs levou à exclusão das mesmas da vida pública. No âmbito da teoria contratual, as relações “verticais” foram mantidas entre homens e mulheres. O caráter do poder político, do governo, do Estado, parece ser fortemente “viril”, excluindo as mulheres.

Olympia de Gauges (a foto é um retrato dela), revolucionaria e pensadora da revolução francesa, dedicava-se à disseminação de direitos universais que incluíssem as mulheres e seus escritos à levaram, literalmente, a perder a cabeça.

Não provoca espanto, portanto, a freqüência com que as escritoras redigiam prefácios às obras recheados de desculpas por sua ousadia, por atrair a atenção; oferecem seus trabalhos como algo cheio de graças, leve, decorativo, algo que não quer ofender nem adquirir valor. Estratagemas, talvez, para se proteger da critica.

Talvez seja por isso que, ainda hoje, a maioria das mulheres que escrevem dominam, principalmente, a literatura de gênero, aquela sem pretensões literárias, reservada ao entretenimento.


quarta-feira, 16 de novembro de 2011

BRUNA SURFISTINHA? ADOREI, PARABÉNS PARA ELA!


Assisti ao filme. E fiquei me perguntando: como é que alguém pode ter considerado esse filme "excitante"? Eu achei um filme de uma tristeza única.
Li o livro também. Não é uma obra prima da literatura, está mal escrito. Mas é uma coisa rara de se encontrar, ainda hoje: é um romance de formação, escrito por uma mulher com visões diferente das minhas, com certeza.
O romance de formação é um verdadeiro gênero literário, que contempla, principalmente, o universo masculino. Os "heróis" são garotos que descobrem o mundo e se tornam adultos através de experiências duras e difíceis. Poucas, pouquíssimas mulheres escreveram e escrevem romances de formação. Principalmente porque teriam que falar de coisas que, mesmo não chegando aos abismos de abjeção física e moral da Bruna, não seriam muito bem vistas.
Por outro lado, livros com protagonistas prostitutas não são, na verdade, nenhuma novidade. É só pensar na famosa Moll Flanders, de Daniel Defoe (um homem). Ou em Naná, de Zola, também um homem.
No máximo, autores que usufruíram dos serviços.
Essa última, Naná, protagonista do homônimo romance, é uma Bruna Surfistinha do século XIX. Acontece, porém, que o fato do autor ser um homem, não é particular secundário: a protagonista morre no final, deturpada pela varíola. Na verdade, quem inspirou o Zola foi uma "mulher de programa" de verdade, uma tal de Valtesse de la Bigne, que exerceu a profissão por muitos anos, guardou um dinheiro e, quando se aposentou, comprou um palacete em Paris, onde viveu felizmente até o final da vida. Um dia, Valtesse encontrou uma jovem prostituta, na rua, tal Liane de Pougy, moça muito bonita, casada, que fugiu do marido. Valtesse a "criou" para deixar a sarjeta e "praticar" nos meios mais abastados da finança e da cultura parisienses. Foi uma Bruna Surfistinha da sua época, tão conhecida que suas fotos eram vendidas como cartões postais das beldades de Paris. A mulher era culta e bem relacionada e, quando chegou aos quarenta, se retirou da profissão e casou com um príncipe romeno. Nenhuma das duas, nem Valtesse nem Liane, morreram sozinhas e abandonadas. Liane conhecia, entre outros, Marcel Proust, que nela se inspirou para delinear uma de suas figuras mais conhecidas da Recherche, Odile de Crecy...
Agora, estamos no século XXI. A profissão mais antiga do mundo (depois da dona de casa) continua existindo, pouco mudada ao longo dos milênios.
Bruna Surfistinha é uma descendente dessas figuras, atualizando-as aos nossos tempos.
Como Valtesse, como Liane, Bruna também apostou suas fichas em algo mais do que somente fazer programas. Escreveu um livro, vendeu os direitos, e, se fosse por mim, não estaria atrás de muitos que ocupam a Academia Brasileira de Letras, pois ela, pelo menos, escreveu e foi lida por muitos mais do que, por exemplo, um Sarney ou um Pitanguy, que na Academia ocupam cadeiras (será que vale como escrita, a cirurgia plástica??? e será que os poemas do Sarney são MUITO melhores do que o livro da Bruna????).
Pelo menos, a menina fez de toda sua vida algo que provocou controvérsias... que é mais do que outros membros da academia fizeram com suas obras!!!
E quanto ao estilo... sinceramente, não é pior do que o do Paulo Coelho, que escreve mal, mas que está na Academia...

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

A DERROCADA DE QUALQUER HUMANIDADE


Em que ano estamos?
Até ontem, achava que era 2011. Já hoje tenho a sensação de perdermos um milênio. Pelo menos em Black Stream, alguém esqueceu de mudar o calendário, e paramos, assim, no ano 1000.
Se continuar assim, em breve voltaremos à Idade da Pedra, e as mulheres serão escolhidas a pauladas na cabeça. Por enquanto, estamos na caça às bruxas.
Em 2011 somos obrigados a ouvir afirmações do seguinte teor:
"DEMITA ESSA LÉSBICA SUJA E NOJENTA IMEDIATAMENTE, QUE NUNCA MAIS APAREÇA EM MINHA FRENTE". É isso que acontece em Black Stream.
Mulheres que dão nojo, pois não estão à disposição das fantasias de dominação masculinas. Mulheres que dão nojo, pois buscam sua independência na vida quotidiana, no trabalho, no pensamento.
Em 2011.
Discriminação é crime?????????
O rancor surdo e tamborilhante de machos psicologicamente impotentes aqui está. E não adianta acharmos que tudo está resolvido porque existem leis.
A lei Maria da Penha não vai impedir que as mulheres sejam espancadas.
As leis que proíbem a discriminação em razão de raça, gênero ou orientação sexual não vão impedir que negros, negras, gays, lésbicas e mulheres fiquem mais em baixo na escada social, que apanhem, que sofram maus tratos, violências físicas e psicológicas.
Assim como a lei que proíbe o aborto não impede que as mulheres o pratiquem, de maneira perigosa e, frequentemente, prejudicial à saúde.
Tem algo profundamente errado em tudo isso. Um tsunami, uma onda de ódio, disfarçada de hipocrisia, é o que se vê todo dia cobrindo de lama as vidas dessas pessoas.
Nã me interessa se a moral cristã é hetero-dirigida. Nos ditos valores cristãos não existe mais qualquer forma de pietas, só existe ódio, medo, castigo que não é sequer ministrado por algum Deus impiedoso, colocado lá em cima mas, sim, por homúnculos arrogantes e infelizes, que se dizem portadores de valores morais. Com cantava Zélia Duncan, os imoráis falam por nós.
Olhamos para o mundo muçulmano com terror, julgando que se trata de uma maré de selvagens, e uma das razões de nossos medos "civilizadores" decorre do tratamento reservado às mulheres.
Todavia, começa a surgir uma dúvida cruel em minha cabeça: não será que, na verdade, todo o espernear ocidental contra "os mouros" decorre do medo de não poder dispor mais de corpos desnudados, de mulheres "bundas & tetas" disponíveis para fantasias que nos despojam de qualquer qualidade humana, de qualquer vivência?
Vivo recolhendo testemunhas de mulheres que perdem o emprego porque não se colocam a disposição de seus chefinhos enquanto bocas e outras cavidades.
Vivo ouvindo afirmações que denigrem tudo que as mulheres fazem, reduzindo-as a pedaços de carne.
Quando não perfumam mais a juventude, as mulheres baixam a cabeça, na humiliação de não ter como pagar suas contas, com parceiros que, em troca de planos de saúde e de um teto, as tratam feitas coisas, as insultam, as abusam.
Quando não são disponíveis aos abusos morais, quando são insubmissas, passam a ser ofendidas, desprezadas, insultadas. E tudo isso, no silêncio da cumplicidade de homens que, no fundo, compartilham da visão.
E de mulheres que, apavoradas pelo constante repetir-se da impunidade, cada vez menos se sentem seguras para tomar uma postura diferente. Melhor ficar caladas, pois as próximas podem ser elas.
Não é mais nem uma sociedade patriarcal, pois nessa às mulheres se confia um papel de submissão mas, ainda assim, quando elas nesse papel se "encaixam", de respeito.
Não, estamos muito além de qualquer patriarcalismo. Estamos em uma pseudoliberdade, onde o mais forte manda, explora, maltrata, insulta, arruina vidas, impede a livre expressão e, PRINCIPALMENTE, que uma mulher possa ganhar HONESTAMENTE seu pão de todo dia. Qualquer lição de tolerância é esquecida, em Black Stream, mas não somente aqui, é regular tomar qualquer liberdade sobre a vida e os corpos das mulheres, pois a impunidade é praticamente garantida, pois na alegre confraria do "clube do bolinha" se tem consciência de que a maioria estará do lado do macho, e no limitado "clube da luluzinha" a preocupação de perder casa/trabalho/RESPEITO amordaça e deixa tudo como está... E tudo se resolve em piadas de mau gosto e na desigualdade mais profunda e injusta que, na história, nem a Idade Média mais estereotipada jamais alcançou...
É tudo verdadeiro. A realidade ultrapassa qualquer imaginação.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

UMA RESSALVA...

Oi, eu de novo...
no meu post anterior, falei de cabeleireiras e concessionárias... Gostaria de fazer uma ressalva, pois não gostaria que, em uma leitura leviana, as cabeleireiras fossem associadas com a prostituição.
ENTÃO, quero deixar claras algumas coisas.
1) Se é verdade que existe a "tradição" de as prostitutas aposentadas abrirem salões de beleza, isso NÃO SIGNIFICA ABSOLUTAMENTE que todas as cabeleireiras têm relação com a profissão das ruas. Somente significa que as ex-profissionais das ruas em muitos casos investem nessa outra profissão. A maioria das cabeleireiras, porém, não tem o antecedente de ter trabalhado na rua, tá?
2) A distinção entre os investimentos das ex-prostitutas e dos cafajestes é uma relação que demonstra que também no mundo do sexo a pagamento, há um forte desequilíbrio de gênero: os cafajestes ganharam muito mais explorando as mulheres, pois concessionárias são um investimento bem mais caro do que salão de cabeleireira.
3) Também faço uma segunda ressalva: nem todos que abriram concessionárias já foram cafajestes.
Agora, escrevo isso só para não ofender a sensibilidade de ninguém, nem os profissionais sérios (que existem).
E, por último: respeito mais as ex-prostitutas, que continuam trabalhando duro em seus salões, do que os ex-cafajestes, que continuam explorando o trabalho alheio...
FUI CLARA????

40 não significa dois de 20!!!

Idade não é uma questão de aritmética, de somas, subtrações.
Uma mulher de quarenta anos não vale, simplesmente, duas de vinte. Mulheres habilidosas, cuja riqueza de experiência adquirida ao longo de quatro décadas de vida, são substituídas, no mundo do trabalho, por lindas, LINDÍSSIMAS garotas de vinte. Somente porque os donos das empresas babam. Ou, pior ainda, porque profissionalidade, capacidades, habilidades das mulheres de quarenta valem zero, nessa matemática, quando a aparência vale 100. Porque vivemos na ditadura do corpo. Porque as mulheres continuam a ser somente isso.
Como sempre, não vale o mesmo para os homens. Muito pelo contrário: homens grisalhos inspiram confiança. Assim, uma amiga querida é despedida sem qualquer justificativa, despachada porque não satisfaz os sonhos babões de algum macho no cio. Porque é trabalhadora, séria, mas já tem quarenta anos. Não estou brincando, aqui precisa mesmo de uma reflexão sobre o que acontece no século XXI.
Deixem-me, então, narrar a vocês porque o Brasil é, sim, um país injusto, um país em que "puxa mais um pentelho que uma parelha de bois".
Estamos em Black Stream, bisonha localidade de clima insuportável, dentro do estado mais "desenvolvido" do país. Há uma empresa, da qual poderia fazer o nome, mas não farei, porque uma vale a outra. Vamos dizer que se trata de uma concessionária que vende carros bem caros, daqueles que se adquirem mais para revelar o status do que por necessidade. Minha amiga é contratada para vender esse produto, na base de um curriculum profissional que revela uma trajetória de seriedade, quase vinte anos de trabalho durante os quais obteve reconhecimentos como melhor vendedora. Para ser contratada, precisa montar uma apresentação sobre um dos produtos. Começa, assim, a trabalhar na empresa. No primeiro dia, ela é apresentada à equipe. O gerente faz questão de realçar o valor PROFISSIONAL de cada membro. Sublinha a seriedade e a competência de cada um, inclusive dela. Sublinha, TAMBÉM, que ele não está interessado em "rostinhos bonitos" (do qual, diga-se de passagem, minha amiga é dotada), mas em resultados, isso é: VENDAS. Enfim, tudo parece se encaminhar da maneira mais séria, concreta, profissional. O primeiro mês, minha amiga não é colocada diretamente nas vendas, pois precisa "aprender". Passa, assim, por uma fase do treinamento. Ainda assim, vende. No segundo mês, apesar de novos impostos que gravam sobre os produtos, vende. Na média de venda da equipe inteira. Aí, começa o terceiro mês. O gerente coloca, para ela, uma meta de vendas, que ela terá que cumprir até o FINAL do mês. Já na primeira semana, cumpre com um terço da meta.
Porém. Porém.
No entanto, algo acontece. Um dia, chega um conhecido dela, para conversar com o gerente. Na frente dela, o ELEMENTO pergunta sobre o desempenho dela. O gerente responde que está começando, que está tudo bem. Sempre na frente dela, o ELEMENTO (que, repito, não é nenhum amigo, é um conhecido), afirma que ele TEM (perceber, por favor, o verbo de POSSE, está falando em mercadoria...) uma verdadeira mulher para a empresa, uma moça belíssima que deveria trabalhar na empresa. Minha amiga, a essa altura, levanta e sai da sala.
A conversa acaba e o gerente encerra o dia com uma pergunta para minha amiga: "Você é homem ou é mulher?"
Intervalo. Publicidade.
Segunda parte.
Minha amiga volta ao trabalho depois do final de semana. Como disse, é começo de mês e já cumpriu com um terço da meta pedida. Na segunda feira, o gerente resolve perguntar aos funcionários, todos, fora ela, se acreditam em papai Noel.
Suspense.
Na terça feira, logo depois de realizar mais uma venda, minha amiga é chamada e, sem qualquer explicação, recebe uma carta de demissão. É mandada embora. Sem explicação.
O melhor.
A explicação chega: uma linda jovem. As mulheres da limpeza vão ter que trabalhar em dobro, para limpar a baba dos machos da empresa. É uma babação absoluta.
Mas minha amiga é demitida. Sem mais. Sem menos.
A coisa é tão repentina, que no RH até escreveram a carta com um sem número de erros.
É tão repentina que chega o pedido mais ABSURDO que funcionário já recebeu: "como ninguém estava preparado para suas demissões, você poderia adiantar as verbas recisórias, que depois a empresa te reembolsa?". Pedido ao qual, evidentemente, minha amiga se nega.
No dia seguinte, ela vai recuperar suas coisas, e descobre que:
a) A moça MARAVILHOSA não passou nem por entrevista, nem por qualquer tipo de apresentação.
b) O dono da empresa, que assinou sua carta de demissão, está tão deslumbrado com o corpo novinho a sua disposição, que chegou a levar de pessoa a moça MARAVILHOSA para o exame médico.
c) A moça MARAVILHOSA não tem nem que esperar um treinamento, nem o uniforme, já começa a ser "disponibilizada" aos clientes...
Para a minha amiga só posso dizer: bem vinda aos quarenta.
Para as outras mulheres que trabalham na empresa, só posso dizer: cuidem-se, pois o próximo rostinho bonito que passar por aí (assim que o novo método de contratação se espalhar, vai ter fila) é o trabalho de vocês que vai para o brejo.
Para o gerente, só posso dizer: e agora, o que você vai fazer, quando apresentar a equipe? Realçar as qualidades profissionais de QUEM?
E, finalmente, para o dono, GOSTARIA de dizer: há uma visão popular, de onde eu venho, que diz que quando prostituta se "aposenta" abre salão de cabeleireiro, quando cafajeste se aposenta abre concessionária... O senhor acabou de demonstrar que essa visão é pra lá de verdadeira.
Ainda.
Gostaria de dizer que tudo isso demonstra a desqualificação das mulheres, novamente reduzidas a "rostinhos bonitos", a "corpos desejáveis", e que descanse em paz a competência, a profissionalidade e a experiência.
De quem é a culpa?
A culpa, sinto dizer, não é dos machos, dos cafajestes, da incapacidade dos homens em governar seus hormônios (o que os coloca realmente no nível dos animais bem pouco racionais).
A culpa, sinto dizer, é NOSSA. Das mulheres. Que não sabemos dizer BASTA às regras dos machos no cio.
PRINCIPALMENTE: a culpa é nossa, porque não podemos ter eternamente vinte anos.
Essa é uma empresária de verdade.













Esse é o sonho masculino de quem deveria trabalhar...

terça-feira, 18 de outubro de 2011

UM CURRICULUM PARA AS MULHERES


Wislawa Szymborska é uma poetisa polonesa, vencedora do Nobel pela literatura. Comprei seu livro, recém publicado pela Cia. das Letras, e entre os vários poemas, encontrei um particularmente legal para explicar que há uma divergência nas formas de interpretar a vida dentro do gênero. Quando escrevemos um curriculum, devemos seguir regras rígidas, pena não sermos consideradas. E, assim, descrevemos nossas atividades selecionando somente aquelas para as quais ALGUÉM decidiu dar importância. Mas será que aquelas excluídas não têm relevância? Eu acredito que, para as mulheres, sim, elas têm. Nem quando escrevemos um memorial, que nada mais é que um curriculum em forma de relato, existe espaço para "a vida". Mas nada melhor do que esse poema para chegarmos ao X da questão...

O que é necessário?
É necessário escrever um pedido,
e ao pedido juntar o curriculum.

Prescindindo do que se viveu
é bom que o curriculum seja sintético.

É obrigatória a brevidade e a seleção dos fatos.
Mudar paisagens em endereços
e incertas lembranças em datas fixadas.

De todos os amores basta aquele conjugal,
e dos filhos, somente os nascidos.

Vale mais quem te conhece de quem você conhece.
Viagens, somente aquelas para o exterior.
O pertencimento a um que, mas sem porque.
Honrarias sem motivação.

Escreva como se nunca falasse com você mesmo
e tentasse se evitar.

Passe por cima de cachorros, gatos e pássaros
penduricalhos do passado, amigos e sonhos.

Melhor o preço do que o valor
e o título do que o conteúdo.
Melhor o tamanho do sapato, do que onde pisou
aquele com o qual te confundem.
Some uma foto com a orelha à vista.

É sua forma que vale, não aquilo que ouve.
O que se ouve?
O ruído das máquinas que picam o papel.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

A MALA EDUCACION GLOBALIZADA

Sexta feira passada fui comprar a comida para os meus gatos. Na entrada do estacionamento da loja havia um pouco de fila. A rua é mão única. De repente, um machinho idiota chega na contramão e tenta furar a fila. Eu, impávida colossa, fingi que não vi e não deixei o moleque entrar na minha frente. O cara começou a berrar, enfurecido, me xingando de malcomida e malamada. So levou meu dedo em riste. Mas isso não seria nada, se não fosse que estamos em um quadro muito mais amplos de ofensas dessa natureza espalhadas pelas boquinhas muito sujas de muitos homenzinhos pelo mundo afora. É só ler as páginas dos jornais, para ver como esse tipo de insultos atravessam transversalmente a nossa realidade. Desde a política, pois é cada vez mais comum o uso de palavras dessa natureza nas aulas dos parlamentos, até o mundo do espetáculo, e o tal de Rafinha CHEIO-DE-ÓDIO-DAS-MULHERES Bastos é o último exemplo de uma longa série.
Não há muito como fugir disso, quando se vive em uma realidade em que, por exemplo, se enaltece a imagem feminina do jeito que os publicitários fazem nos comerciais da Hope: a Gisele Bundchen ensina que é possível convencer um imaginário parceiro a pagar para tudo e a ficar tranquilo sobre o arrombo na conta bancária oferecendo suas graças. Me digam se esse não é um convite claro a nos transformarmos em um corpo sem cabeça, sempre e de qualquer jeito!

terça-feira, 11 de outubro de 2011

LITERATURA DE VIAGEM SEXUADA


(FOTOS: Annemarie Schwarzenbach
e Vita Sackville-West)

Há pouca literatura de viagem produzida por mulheres. Para falar a verdade, quem me vem à cabeça é Vita Sackville-West (que não escreve exatamente crônicas, mas uma literatura que está entre memória e romance). Também me lembro de outra autora, essa bem menos conhecida, Annemarie Schwarzenbach, que relata suas viagens tanto para o oriente (genial, descobrir o Afeganistão da primeira metade do século XX pelas palavras de uma mulher...), como para os EUA (durante a Depressão).
Claro, há outras, mas muito menos conhecidas do que, sei lá, um Bruce Chatwin da vida. Quero dizer, não há comparação entre o número de relatos de viajantes masculinos, que criam um corpus literário de outra espessura. Virgínia Woolf, em seu já batido ensaio A room of her own coloca a limitação imposta às mulheres, que raramente tinham (têm???) um espaço próprio dentro do lar, onde possam pensar e escrever a salvo das interferências familiares e domésticas. Quero, aqui, realçar a outra limitação: a do acesso ao espaço externo, da possibilidade de "andar" pelo mundo, seja nas ruas da cidade como nas estradas das possibilidades das viagens, das possibilidades que a história, com afinco e sistematicamente, lhes negou.
Falo no passado, mas tenho a sensação de que essas limitações continuam, e muito, ainda nos dias de hoje.
Pensem nos inúmeros espaços e lugares onde, ainda hoje, as mulheres não têm direito de trânsito, onde somente os homens pisam.
Boa parte do mundo continua rejeitando até a simples hipótese de mulheres em movimento sozinhas, sem a "tutela", a "autorização" e a "companhia" de pais, irmãos, filhos ou maridos.
Elas são proibidas no acesso a espaços públicos e religiosos em um sem números de lugares do mundo. Também, lá onde as interdições religiosas aparentam ter desaparecido (e é coisa mais recente do que se imagina...), não é raro que uma mulher sozinha, em veste de viajante, se encontre em situações constrangedoras, quando não até de perigo.
Se no "interior" temos pouco espaço, no "exterior" também, o que nos sobra, a não ser o não lugar onde a definição do que somos não tem cidadania, a não ser, mais uma vez, pelas palavras e os olhares do masculino?
Por isso achei tristemente irreal o final do último filme de Alice no País das Maravilhas... uma mulher que viaja sozinha? Somente nos sonhos!

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

SOBRE O MUSEU DA INOCÊNCIA

Em seu romance o Museu da inocência, Orhan Pamuk narra uma história de amor ambientada na Istambul da década de 1970. O protagonista, Kemal Basmaci, é noivo da jovem Sibel, quando encontra a prima Fusun, pela qual se apaixona e com a qual tem um relacionamento breve, porém intenso. A história deles, todavia, acaba, pois Kemal não rompe com a noiva. Separados, Kemal se apercebe que sem Fusun não consegue viver, e passa oito anos em busca da possibilidade perdida dessa história de amor. Como “antídoto” à sua dor de amor, Kemal começa a recolher objetos que pertenceram a Fusun ou que remetem a lugares e momentos associados a ela. Ele guarda esses objetos no apartamento onde se encontrava com a moça. Quando Fusun morre, Kemal toma a decisão de comprar dos pais dela a casa onde morava e de expor os objetos recolhidos aos olhares do público, inaugurando, assim, o Museu da Inocência.

Raramente um romance é tão fiel ao seu titulo: ler O museu da inocência é como entrar e visitar um museu. Virar as páginas corresponde a visitar suas salas, em que nos deparamos com os objetos expostos nas vitrines, lendo as escritas das placas que explicam. Assim como em um museu, o autor reconstrói um mundo, salvando-o do esquecimento. O autor nos devolve a história de amor entre Kemal e Fusun, em cada detalhe singular e, ao mesmo tempo, recria a vida de uma cidade, Istanbul, na década de 1970.

As datas são importantes em qualquer museu: nesse, a primeira é 26 de abril de 1975 e a última será nove anos e quatro meses depois. A primeira é a data do dia em que Kemal entra na loja onde Füsun trabalha como vendedora e a última é do dia em que Kemal e Füsun viajam para a Europa, quando tudo acaba. A simples história desse amor é banal.

Quando a noiva de Kemal o abandona, o protagonista reencontra Fusun, casada, e começa um louco período em que ele freqüenta a casa dela e de sua família entre três e cinco vezes por dia. Ao longo de sete anos, dez meses e três dias, ao longo de 409 semanas, Kemal janta na casa da família da moça 1593 vezes.

A exatidão dos números é importante, pois oferece uma medida da meticulosidade doentia com que Kemal conserva, em sua memória, os vestígios de seu amor. A essa altura da história, ele ainda não sabe que, depois de visitar 5723 museus, dedicaria um museu a Füsun. Começa, todavia, a acumular objetos que pertenceram à moça, roubando na casa dela lenços, grampos, bibelôs, saleiros. Em seguida, amplia o campo de sua coleção, pois Füsun não é mais somente Füsun, tornou-se a cidade em que se amaram, está no navio do qual seus olhos se pousaram sobre o Bósforo, na garrafa de refrigerante, nos outdoors publicitários, na caixa de cigarros (ou na própria bituca), nos shows televisivos e em suas guias de programação, em uma infinidade de objetos e imagens que acabam se recompondo, como em um caleidoscópio, dentro do Museu da Inocência, espécie de Jardim do Éden antes da queda. Ainda que, aparentemente, no centro da memória se encontre Füsun, é, na verdade, Kemal que sempre fala de Kemal, personagem narcisista, frequentemente irritante, que encerra sua narrative afirmando que “Tive uma vida feliz”, sem se perguntar quantas pessoas, por causa disso, foram infelizes, e que - com uma pirandeliana virada narrativa – pede ao escritor Orhan Pamuk (que já encontramos dançando com Füsun durante a festa de noivado de Kemal com Sibel) para escrever o livro que estamos lendo, para que esse desenvolva o papel de catalogo e guia completo do museu, para que todos os visitantes possam se deslocar por suas vitrines com a clareza do que estão vendo e das razões pelas quais os objetos estão ordenados conforme uma dada narrativa. Em 1999 Orhan Pamuk comprou um palacete histórico em Istanbul para realizar um projeto ligado ao romance, encarregando o arquiteto Ihsan Bilgin – antes de começar a escrever o romance - de transformar o prédio em um museu, onde o livro e o próprio museu se cruzassem na história de amor entre Kemal e Füsun, os protagonistas. Depois de nove anos, tanto o romance como o museu nasceram contemporaneamente.

Nas últimas páginas do romance, Pamuk elabora de maneira clara e eficaz uma verdadeira “teoria do museu e das coleções”, oferecendo, inclusive, um mapa para chegar facilmente às suas instalações e dependências, e uma cópia de uma entrada, que todo leitor poderá apresentar para visitar o museu: será um percurso lento, às vezes tedioso, às vezes dará vontade de pular alguma sala e deixar de lado alguma relíquia que nos parece já conhecida. No final, todavia, sairemos do museu com a sensação de ter visitado a vida, que se trata de uma coleção de momentos felizes.

Na foto: o palacete onde foi inaugurado o Museu da inocência.

SEM HUMOR.

Segunda feira, véspera de véspera de feriado. Já fiquei sabendo que meus alunos resolveram boicotar a aula de hoje. Ficaria trabalhando (ou procrastinando meu trabalho) sem ter a angústia de preparar a aula. Mas não, uma pequena parcela deles estará em sala de aula. Então, lá vou eu, me perguntando a razão pela qual os que estarão presentes são masoquistas. E também o que passa pela cabeça dos que resolveram antecipar o feriado. E nesse meu inútil pensar, nada acontece, mais um dia sem sentido se vai e eu continuo parada que nem poste. Meu humor está na altura das canelas, só porque estou de bom humor. Quero somente desaparecer um pouco do mapa. Sei lá, já que não posso tirar férias, dá para me provocar um coma induzido para ter uns dias de descanso?

terça-feira, 4 de outubro de 2011

FEMINISMO & FEMINISMOS



Black Stream é mais um lugar onde pertencer ao sexo feminino já cria desvantagens. Não vamos fingir que uma cidade provinciana do interior represente uma vanguarda nos costumes & nos hábitos das relações de gênero.
Viver no meio de posturas machistas é uma experiência que, em maior ou menor grau, todas as mulheres vivenciam. Machismo é algo que pode ser grosseiramente expresso ou adquirir tonalidades mais sutis, portanto mais difíceis de se enfrentar. O leque da expressão "soft" machista, daquele macho, para ser clara, que gosta de se declarar "não machista", se abre com as piadas sobre as loiras, seguidas com as piadas sobre as feministas quando não demonstramos particular agrado pelas piadas sobre as loiras. Seguem tratamentos que oscilam entre prestar uma atenção distraída ao que se fala, com respostas paternalistas e, em geral, esses machos autoafirmados como "não machistas", te olham e te escutam como se sempre estivessem um degrau acima: sempre com uma certa condescendência. Em geral, demonstram interesse nas tuas palavras somente se neles há alguma forma tesão sexual. Tua cabeça é avaliada como inversamente proporcional ao tamanho da bunda, o fetiche "grande" dos brasileiros.
De tanto passar por isso, se acaba adquirindo uma doença muito comum e infecto contagiosa, a "síndrome de gênero": a eterna incerteza, o eterno ficar na fronteira entre aceitar que você é um modelo e se retrair como "uma boa mulher faz", cedendo o passo aos homens, ficando atrás de
suas figuras... assim, mulheres de destaque, de liderança, habilidades que você, às vezes, parece olhar com perplexidade, como se essas qualidades não lhe pertencessem, acabam sempre em segundo lugar. O problema é que quando damos peso aos chiliques de homens de TPM ou quando cedemos à arrogância de quem se acha poderoso, especialmente perante mulheres, único poder que lhes é dado por uma idéia errada de "natureza" dos gêneros, que vêem como menos poderosas, acabamos nos "reduzindo". Ainda mais se não somos jovens, atraentes e simpáticas. Somente mulheres comuns capazes de pensar não somente nos trilhos daquilo que toda mulher pensa desde criança, mas também naqueles territórios que pertencem à tradição e à linguagem masculina, como a ciência ou a política.
Sempre me é difícil digerir que mulheres capazes, ativas,inteligentes e habilidosas, que já obtiveram reconhecimentos pelas suas atividades acabem deixando papeis de relevância nas mãos dos machos. Que, regularmente, se consideram à altura, e se reconhecem entre si nesse papel. Poucas e importantes são aquelas mulheres que conseguem se salvar de rótulos estereótipos ligados ao feminino. Por isso que gosto da Dilma, diga-se de passagem...

É necessário que haja uma mudança de atitude perante as mulheres jovens que buscam se espelhar, encontrar e reelaborar modelos femininos. Seria interessante que se encontrassem enfrentando o desafio de se tornar mulheres fortes, empoderadas (empowered) e que apresentam resultados de maneira tal que ninguém ousasse mais olha-las com uma certa perplexidade, ponderando quem foi o homem que as colocou lá. Sempre de passagem, diga-se que a Dilma não escapou disso... aqueles que não a queriam, a atacaram alegando que atrás dela havia a figura do Lula. Claro que sim... como atrás do Serra havia o FHC na época de sua disputa contra o próprio Lula... E que eu lembre, não pareceu tão estranho! Enfim, quando se coloca o Lula "atrás" da Dilma, se entende que ela não tem vontade própria e que ela será mera executora das vontades do Lula. Por sorte, a Dilma é, definitivamente, outra coisa respeito à essa idéia. Quer se goste ou não da política atual. Ela deve tornar-se uma figura de referência, um modelo com o qual confrontar-se.

Em uma certa medida devemos nos perguntar como desenvolver esse modelo. Aliás, em termos de "teorias de gênero", essa questão de modelo feminino que abre e mostra caminhos às outras é fundamental, porque raro e marcado por dificuldades, dúvidas e, também, os erros de quem pisa em territórios que nem sempre reconhecem nossas habilidades ou, até, nosso direito de sermos "ambiciosas". Precisamos procurar e nos tornar poderosas "mães simbólicas" para aprendermos!!

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Nunca estudo cientifico foi mais esclarecedor... e meu teclado hoje nao deixa colocar os acentos, portanto farei um post sem acentos. Desculpem meu teclado.
Voltando ao tema: essa imagem circula pele rede e diz tudo sobre as condiçoes de vida em Black Stream. Ontem, finalmente, choveu. Um pouco. Depois parou e hoje vai voltar a fazer muito calor. Semana passada, chegou a 43 graus. Nessas condiçoes, ate pensar fica dificil. E eu preciso escrever. Mas fico naquela de procrestinar. Procrastinar. Procrastinar.
Fim do post de porcrastinaçnao.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

ALERTA! COMPARTILHEM! PERIGO!

POR FAVOR, compartilhe essa mensagem se você tiver algum amigo ou parente que foi comido por um dragão. De fato, os dragões são praticamente impossíveis de serem parados. Poucos sabem que cospem fogo. 93% das pessoas não vai compartilhar essa mensagem porque já foi devorado. Outro 6% se esconde debaixo do chuveiro armado de extintor. Mas sobra aquele 1% que tem consciência social e vai compartilhar. Muito obrigada pela sua atenção, boa sorte e muito cuidado!

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Nissan - Pôneis Malditos


Os Pôneis Malditos da Nissan pick-up não têm nenhuma mensagem subliminar de natureza infernal, não. Porém, eles são sexistas & machistas.
Pensem bem: o cara anda pela lama, é macho e quer fazer coisas de macho (i.e. sujar o carro, bater em árvores, suar & feder). Porém, a pick-up atola. De quem é a culpa? De pôneis coloridos em tons pasteis, que remetem ao imaginário infantil das meninas. Eles fazem um carrossel, cantando uma musiquinha cheia de lalalalalalá, e ainda um deles voa até o rosto do cara, o beija e fala que o quer...
Traduzindo: quer uma pick-up de macho, puxada por cavalos (onde o cavalo é um garanhão, é claro), ou uma coisa de menininha (trocando em miúdos, de viadinho?).
É sexista, sim, mas eu quero os pôneis!!!!!

quinta-feira, 2 de junho de 2011

POR ONDE PASSA A DISCRIMINAÇÃO?



Meus tempos de reflexão estão se tornando verdadeiras "eras geológicas". Fico moendo & remoendo situações por meses, me sinto uma ruminante perpétua. Aí, me dá na telha uma vontade de sistematizar essas ruminações infinitas por escrito. E se vai mais um tempo longo. Bom, uma das coisas que ando remoendo a um tempo é sobre o que significa "discriminação" no cotidiano. Quero dizer: em teoria, todos somos bons & cheios de palavras certinhas, mas na hora H, eis que a imbecilidade toma conta do pedaço. Vou dar um exemplo: lá estava eu em um almoço muito legal, todo mundo feliz em volta da mesa, umas quinze pessoas amigas e de cabeça aberta. Tão aberta que ninguém jamais pensou em tratar de maneira antipática a mim e à minha companheira de vida. Muito pelo contrário, todos se mostram felizes em ver uma parceria de duas pessoas que vivem juntas, que dividem o dia a dia feito de trabalho, tempo livre, responsabilidades e diversão. Moramos como duas pessoas que se amam fazem. Não nos consideramos "namoradas", mas vivemos em uma união estável. Manifestações positivas nos vieram dos amigos, recebemos em casa e somos recebidas sempre com afeto e respeito. Nesse almoço também a situação era essa.
Até o momento em que alguém trouxe à tona o "grande escândalo" da semana: a aprovação da lei que permite o "casamento gay". E aí, senhores e senhoras, os preconceitos vêm à tona.
É como se, de repente, a cabeça das pessoas entrasse em curto circuito. Como se tivesse um apagão. De repente, as duas mulheres que sentam à mesma mesa desaparecem da realidade, são apagadas de sua existência concreta, real, manifesta. Sua presença se torna um fantasma. Começam os comentários, todos se manifestam contra esse escândalo inaceitável. Os gays não devem ter o direito de casar. Isso é um absurdo. Isso é contra a natureza.
Os gays se tornam entidades inimigas, perigosos seres ameaçadores de misteriosos valores inscritos nos repositórios mais íntimos que o "politicamente correto" impede de expressar na convivência real. Eu e minha parceira somos, evidentemente, manifestamente gay. Nós somos a realidade feita de responsabilidade e cotidianidade. Somos as mesmas que, de repente, de amigas, pessoas respeitadas, se tornam o indecente, o inaceitável.
Quando se fala dessa lei, se fala contra pessoas reais. É uma lei que envolve o direito de quem senta ao seu lado na mesa do almoço, de quem é visto como amigo/a.
Sei que é difícil pensar em uma associação muito feia como a que estou para fazer, mas precisa parar e pensar nisso:
muitos nazifascistas, depois da guerra, disseram que, apesar de apoiar regimes que levavam os judeus aos campos de concentração, eram amigos de famílias judias. Portanto, não apoiavam realmente o regime. Mas estavam, fundamentalmente, de acordo com a necessidade de livrar o mundo de quem era oficialmente visto como indesejável.
É, sinto muito dizer, a mesma coisa. Os gays estão entre vocês. Com seus sorrisos e seus problemas. Vocês convivem com eles e elas e são amigos deles e delas.
Então, por que tanta angústia, na hora de permitir que tenham alguns direitos que fazem parte da vida de quem escolhe ser um casal? Por que continuam não querendo que, em caso de doença, o/a parceira possa cuidar do/a outro/a? Por que não posso colocar minha parceira como dependente de um plano de saúde? Por que não deixar que seja possível ter os mesmos benefícios de qualquer outro casal?
Está na hora de parar e de pensar, de buscar uma coerencia no dia a dia, na convivência conosco, que não somos nenhum monstro, nenhuma entidade escondida na escuridão pronta para contagiar com nossa felicidade, diferente, mas que procura sua integração.
Beijos a todos os amigos que não se apercebem de seus medos, continuo amando-os!
P.S. Ontem apareceu uma foto de uma passeata evangélica. Mostrava uma faixa com a escrita: "Daqui a pouco vão dizer que a Bíblia é homofóbica". Muito bem, alguém me demonstre que não é, porque é exatamente com base nesse conjunto di livros que muita gente discrimina, ataca e quer eliminar.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

LA NOTIZIA CHE NON HO INCONTRATO.

Scorrendo i titoli dei giornali, ho sentito la mancanza di una notizia: quella delle manifestazioni spontanee che ricordassero al mondo che c'è ancora chi non crede al potere risolutivo delle armi, che l'Italia ripudia la guerra e che è un paese in cui è possibile la solidarietà verso quelli che le armi non ce le hanno, indipendentemente dal fatto che, nei loro paesi di origine, appoggino uno o l'altro dei contendenti. Facciamo un' ipotesi assurda, giochiamo alla fantapolitica. Facciamo finta di essere un'Italia in guerra. Così, giusto per rilassarsi un po'. Facciamo finta che l' Italia sia un posto dove da sempre si emigra. Oggi si emigra ben vestiti. Gli emgranti italiani arrivano all' estero come minimo con una laurea in tasca, sono lavati, ben vestiti, preparati. Sono cognitari, mano d'opera intellettuale. Vabbè, diciamo anche che in Italia ci sono fazioni politiche con interessi diversi e che, a un certo punto, ci siano i secessionisti, i fascisti e gli "altri". Gli "altri" sono un'entità confusa che, in parlamento, è chiamata opposizione. L' unica cosa che hanno in comune è un generico rispetto per i principi ancora illuministi della divisione dei poteri (principio basico della democrazia, si imparava già alle elementari, quando io ero bambina e facevo, appunto, le elementari dalle suore...non mi hanno mai obbligata a fare la comunione e sono orgogliosamente anticlericale, nel ricordo di maestra Romana, la suora cuoca gentilissima, di maestra Chiara, una donna che oggi vedo come "donna di successo" per meriti propri, e così via. Ma sto divagando, scusate, torno alla fantascienza di un'Italia immaginaria...). Dicevo, allora, che ci sono forze in campo che, ormai, sono disposte all' uso delle armi (per esempio, mafia e camorra e sacra corona e 'ndrangheta, ma anche padani convinti, che magari in alcuni luoghi hanno gente armata. È assurdo, certo, come poteva essere assurdo pensare che in yugoslavia ci fosse quel che ci fosse. Poi c' era quella folla confusa, che magari, all' inizio, appoggiava l' uno o l'altro, ma poi si ritrovava ad essere bersaglio quando stava in fila per il pane. Un classico della storia, questa relazione assolutamente emotiva della morte/rivoluzione per il pane. Insomma, alla fine c' era la gente che viveva in famiglia, lavorava, sperava in un futuro migliore per i figli che si è vista interrompere il tempo della vita, quello fatto dai ritmi della speranza. Nell'Italia del nostro gioco, facciamo finta che ci sia una famiglia leghista, una fascista e una degli "altri". Facciamo finta che vivano in una città del centro Italia, che ne so, Lucca. Un posto interessante, perché nella seconda guerra mondiale ha avuto la linea gotica a un sputo, è alle falde dell' appennino tosco-emiliano. Per cui, ci sarà una "generica" tradizione da parte di molte famiglie, di una memoria degli avvenimenti. Che ne so: la nonna che nascose il nonno, fuorilegge dal '43 perché membro dell' arma dei carabinieri, fedele al re. Allora il nonno si nascose dalla nonna, ma un giorno i fascisti bussarono alla porta e il nonno fece appena in tempo a nascondersi dietro alla porta. La nonna, che negli anni trenta era stata una "giovane italiana", divertendosi un sacco a fare ginnastica, si trovò così a fronteggiare i fascisti che chiedevano del nonno, convincendoli che lui non c' era. Dimenticavo di dire che, in questa memoria possibile di un qualche lucchese di oggi, il nonno era nascosto dietro la porta, si, ma con la pistola in mano... Allora, le tre famiglie lucchesi sono composte da genitori tra i 50 e i settanta e figli tra i 20 e i 40.

Facciamo finta, ora, che qualcuno, tra i figli, "emigri". Qualcuno, tra i figli, sia disoccupato o precario. Qualcuno lavora in polizia. Qualcuno va a caccia. Facciamo finta che tutte e tre le famiglie siano armate per una qualche ragione e che, ad un certo punto, una delle fazioni decida di prendere in mano le redini della situazione in un rapido colpo di mano, perché non ci riesce cambiando istituzionalmente l'assetto delle regole. Oh, si pensa sempre per assurdo, mica che cose del genere succedono in Italia. Allora, si comincia a sparare. E le nonne, le figlie, i nipotini, cominciano a vedere qualcuno della famiglia che piglia l' arma da caccia o di ordinanza e decide di reagire. Si cerca di mandare la nonna e il nipotino in svizzera, ma alla frontiera i leghisti svizzeri ci fanno fanno no praticamente in bergamasco e scuotono la testa con le armi in mano. Si cerca di fare uscire il figlio sposato con la nuora e la nipotina da Mentone, ma forti della riforma del trattato di Schengen rivisto, i francesi ci dicono no con accento garibaldino, scuotendo la testa con le armi in mano. Nel frattempo, gli austriaci hanno già chiuso la frontiera, con la benedizione del santopadre di turno (tanto, morto un papa se ne fa un altro). Ci resta Capodistria, speriamo in bene... Come se non bastasse, siccome all' Europa mica va bene che uno dei membri sia territorio di guerra, risolvono di fare attacchi mirati. Nel mentre, cominciano ad apparire gli abusi e i soprusi delle parti in gioco, si cerca casa per casa il nemico. Magari, qualcuno potrebbe bussare alla porta di una che, se sopravviverà, un giorno sarà ricordata come la "nonna che salvò il nonno". Si stupra, si ammazza, si brucia, si scappa. Ci si pente o si rafforzano certe credenze sulle parti in campo, ma la maggior parte in fondo, cerca di sopravvivere. Quelli che non sparano. I nonni e le nonne, i bambini e molte donne. Quelli che non hanno voglia di farsi ammazzare, che mica tutti sono eroi per alcune idee confuse, in fondo la maggior parte delle persone cerca di sopravvivere nel migliore dei modi possibile.

Fine del gioco. Dicevo, all'inizio, che mi dispiace molto non aver visto la notizia del popolo, per lo meno gli "altri" o parti di loro, scendere in piazza contro il bombardamento in se. Gli unici a dire che sono un pochino (ma mica abbastanza, secondo me) contrari sono i leghisti. Ma solo per la paura che l' uomo nero sbarchi dalla Libia, da dove tutti sanno arrivano solo terroristi. Parlano strano, stuprano le nostre donne, spacciano, sono sporchi, fanno paura, paura, paura). Magari dovremmo tutti rileggere Camus. O magari avremmo bisogno di ricordarci delle nostre nonne che difendevano il loro uomo dalla minaccia di morte del nemico. Gente che non votava neanche, perché il voto non era esattamente come oggi, magari non sappiamo neppure se avrebbero votato per un Berlusconi dei loro tempi o per un altro, ma che ad un certo punto si sono accorti che la cosa non era neppure più possibile risolverla con una rissa da bar, che in fondo, era un vivere civile.

Comunque: ci siamo davvero dimenticati di tutti quei valori che gli "altri", quelli che la carta costituzionale l' hanno fondata, hanno proposto? Pace, diplomazia, solidarietà, avversione alle soluzioni con le armi, vivere civile... E invece, l' unica preoccupazione sembra essere se il governicolo attuale cade per colpa della lega. Si, ma intanto siamo là a cacciabombardare qualche libico, giocando al piccolo chirurgo. Ogni tanto i chirurghi sbagliano, ma tante scuse e arrivederci.

Forse mi aspettavo non dico una discesa in piazza come quella spontanea degli spagnoli dopo gli attentati di Madrid, ma per lo meno un' "accesa scossa d' indignazione" che scuotesse la parte civile della popolazione, quella si, mi sarebbe piaciuta...

A proposito, le tre famiglie lucchesi hanno avuto la fortuna di conoscere un famiglia all' Elba e, costretti a condividere lo stesso spazio, nonostante le loro differenze anche radicali sono stati obbligati a sedersi, discutere, litigare pure. Per convivere senza ammazzarsi, per non dover scappare e trovarsi di fronte l'indifferenza o l'odio palese alla frontiera. Per non vedere nessun figlio morire, nessun nipote soffrire la fame. Le tre famiglie non si amano, si tollerano. Ma la figlia del fascista si è proprio innamorata del ragazzo degli "altri" che, prima di tutta questa gran tormenta, faceva architettura a Pisa... Discutono molto, litigano pure, ma è solo perché hanno molta, molta voglia di costruire il futuro dei loro figli...