terça-feira, 18 de outubro de 2011

UM CURRICULUM PARA AS MULHERES


Wislawa Szymborska é uma poetisa polonesa, vencedora do Nobel pela literatura. Comprei seu livro, recém publicado pela Cia. das Letras, e entre os vários poemas, encontrei um particularmente legal para explicar que há uma divergência nas formas de interpretar a vida dentro do gênero. Quando escrevemos um curriculum, devemos seguir regras rígidas, pena não sermos consideradas. E, assim, descrevemos nossas atividades selecionando somente aquelas para as quais ALGUÉM decidiu dar importância. Mas será que aquelas excluídas não têm relevância? Eu acredito que, para as mulheres, sim, elas têm. Nem quando escrevemos um memorial, que nada mais é que um curriculum em forma de relato, existe espaço para "a vida". Mas nada melhor do que esse poema para chegarmos ao X da questão...

O que é necessário?
É necessário escrever um pedido,
e ao pedido juntar o curriculum.

Prescindindo do que se viveu
é bom que o curriculum seja sintético.

É obrigatória a brevidade e a seleção dos fatos.
Mudar paisagens em endereços
e incertas lembranças em datas fixadas.

De todos os amores basta aquele conjugal,
e dos filhos, somente os nascidos.

Vale mais quem te conhece de quem você conhece.
Viagens, somente aquelas para o exterior.
O pertencimento a um que, mas sem porque.
Honrarias sem motivação.

Escreva como se nunca falasse com você mesmo
e tentasse se evitar.

Passe por cima de cachorros, gatos e pássaros
penduricalhos do passado, amigos e sonhos.

Melhor o preço do que o valor
e o título do que o conteúdo.
Melhor o tamanho do sapato, do que onde pisou
aquele com o qual te confundem.
Some uma foto com a orelha à vista.

É sua forma que vale, não aquilo que ouve.
O que se ouve?
O ruído das máquinas que picam o papel.

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

A MALA EDUCACION GLOBALIZADA

Sexta feira passada fui comprar a comida para os meus gatos. Na entrada do estacionamento da loja havia um pouco de fila. A rua é mão única. De repente, um machinho idiota chega na contramão e tenta furar a fila. Eu, impávida colossa, fingi que não vi e não deixei o moleque entrar na minha frente. O cara começou a berrar, enfurecido, me xingando de malcomida e malamada. So levou meu dedo em riste. Mas isso não seria nada, se não fosse que estamos em um quadro muito mais amplos de ofensas dessa natureza espalhadas pelas boquinhas muito sujas de muitos homenzinhos pelo mundo afora. É só ler as páginas dos jornais, para ver como esse tipo de insultos atravessam transversalmente a nossa realidade. Desde a política, pois é cada vez mais comum o uso de palavras dessa natureza nas aulas dos parlamentos, até o mundo do espetáculo, e o tal de Rafinha CHEIO-DE-ÓDIO-DAS-MULHERES Bastos é o último exemplo de uma longa série.
Não há muito como fugir disso, quando se vive em uma realidade em que, por exemplo, se enaltece a imagem feminina do jeito que os publicitários fazem nos comerciais da Hope: a Gisele Bundchen ensina que é possível convencer um imaginário parceiro a pagar para tudo e a ficar tranquilo sobre o arrombo na conta bancária oferecendo suas graças. Me digam se esse não é um convite claro a nos transformarmos em um corpo sem cabeça, sempre e de qualquer jeito!

terça-feira, 11 de outubro de 2011

LITERATURA DE VIAGEM SEXUADA


(FOTOS: Annemarie Schwarzenbach
e Vita Sackville-West)

Há pouca literatura de viagem produzida por mulheres. Para falar a verdade, quem me vem à cabeça é Vita Sackville-West (que não escreve exatamente crônicas, mas uma literatura que está entre memória e romance). Também me lembro de outra autora, essa bem menos conhecida, Annemarie Schwarzenbach, que relata suas viagens tanto para o oriente (genial, descobrir o Afeganistão da primeira metade do século XX pelas palavras de uma mulher...), como para os EUA (durante a Depressão).
Claro, há outras, mas muito menos conhecidas do que, sei lá, um Bruce Chatwin da vida. Quero dizer, não há comparação entre o número de relatos de viajantes masculinos, que criam um corpus literário de outra espessura. Virgínia Woolf, em seu já batido ensaio A room of her own coloca a limitação imposta às mulheres, que raramente tinham (têm???) um espaço próprio dentro do lar, onde possam pensar e escrever a salvo das interferências familiares e domésticas. Quero, aqui, realçar a outra limitação: a do acesso ao espaço externo, da possibilidade de "andar" pelo mundo, seja nas ruas da cidade como nas estradas das possibilidades das viagens, das possibilidades que a história, com afinco e sistematicamente, lhes negou.
Falo no passado, mas tenho a sensação de que essas limitações continuam, e muito, ainda nos dias de hoje.
Pensem nos inúmeros espaços e lugares onde, ainda hoje, as mulheres não têm direito de trânsito, onde somente os homens pisam.
Boa parte do mundo continua rejeitando até a simples hipótese de mulheres em movimento sozinhas, sem a "tutela", a "autorização" e a "companhia" de pais, irmãos, filhos ou maridos.
Elas são proibidas no acesso a espaços públicos e religiosos em um sem números de lugares do mundo. Também, lá onde as interdições religiosas aparentam ter desaparecido (e é coisa mais recente do que se imagina...), não é raro que uma mulher sozinha, em veste de viajante, se encontre em situações constrangedoras, quando não até de perigo.
Se no "interior" temos pouco espaço, no "exterior" também, o que nos sobra, a não ser o não lugar onde a definição do que somos não tem cidadania, a não ser, mais uma vez, pelas palavras e os olhares do masculino?
Por isso achei tristemente irreal o final do último filme de Alice no País das Maravilhas... uma mulher que viaja sozinha? Somente nos sonhos!

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

SOBRE O MUSEU DA INOCÊNCIA

Em seu romance o Museu da inocência, Orhan Pamuk narra uma história de amor ambientada na Istambul da década de 1970. O protagonista, Kemal Basmaci, é noivo da jovem Sibel, quando encontra a prima Fusun, pela qual se apaixona e com a qual tem um relacionamento breve, porém intenso. A história deles, todavia, acaba, pois Kemal não rompe com a noiva. Separados, Kemal se apercebe que sem Fusun não consegue viver, e passa oito anos em busca da possibilidade perdida dessa história de amor. Como “antídoto” à sua dor de amor, Kemal começa a recolher objetos que pertenceram a Fusun ou que remetem a lugares e momentos associados a ela. Ele guarda esses objetos no apartamento onde se encontrava com a moça. Quando Fusun morre, Kemal toma a decisão de comprar dos pais dela a casa onde morava e de expor os objetos recolhidos aos olhares do público, inaugurando, assim, o Museu da Inocência.

Raramente um romance é tão fiel ao seu titulo: ler O museu da inocência é como entrar e visitar um museu. Virar as páginas corresponde a visitar suas salas, em que nos deparamos com os objetos expostos nas vitrines, lendo as escritas das placas que explicam. Assim como em um museu, o autor reconstrói um mundo, salvando-o do esquecimento. O autor nos devolve a história de amor entre Kemal e Fusun, em cada detalhe singular e, ao mesmo tempo, recria a vida de uma cidade, Istanbul, na década de 1970.

As datas são importantes em qualquer museu: nesse, a primeira é 26 de abril de 1975 e a última será nove anos e quatro meses depois. A primeira é a data do dia em que Kemal entra na loja onde Füsun trabalha como vendedora e a última é do dia em que Kemal e Füsun viajam para a Europa, quando tudo acaba. A simples história desse amor é banal.

Quando a noiva de Kemal o abandona, o protagonista reencontra Fusun, casada, e começa um louco período em que ele freqüenta a casa dela e de sua família entre três e cinco vezes por dia. Ao longo de sete anos, dez meses e três dias, ao longo de 409 semanas, Kemal janta na casa da família da moça 1593 vezes.

A exatidão dos números é importante, pois oferece uma medida da meticulosidade doentia com que Kemal conserva, em sua memória, os vestígios de seu amor. A essa altura da história, ele ainda não sabe que, depois de visitar 5723 museus, dedicaria um museu a Füsun. Começa, todavia, a acumular objetos que pertenceram à moça, roubando na casa dela lenços, grampos, bibelôs, saleiros. Em seguida, amplia o campo de sua coleção, pois Füsun não é mais somente Füsun, tornou-se a cidade em que se amaram, está no navio do qual seus olhos se pousaram sobre o Bósforo, na garrafa de refrigerante, nos outdoors publicitários, na caixa de cigarros (ou na própria bituca), nos shows televisivos e em suas guias de programação, em uma infinidade de objetos e imagens que acabam se recompondo, como em um caleidoscópio, dentro do Museu da Inocência, espécie de Jardim do Éden antes da queda. Ainda que, aparentemente, no centro da memória se encontre Füsun, é, na verdade, Kemal que sempre fala de Kemal, personagem narcisista, frequentemente irritante, que encerra sua narrative afirmando que “Tive uma vida feliz”, sem se perguntar quantas pessoas, por causa disso, foram infelizes, e que - com uma pirandeliana virada narrativa – pede ao escritor Orhan Pamuk (que já encontramos dançando com Füsun durante a festa de noivado de Kemal com Sibel) para escrever o livro que estamos lendo, para que esse desenvolva o papel de catalogo e guia completo do museu, para que todos os visitantes possam se deslocar por suas vitrines com a clareza do que estão vendo e das razões pelas quais os objetos estão ordenados conforme uma dada narrativa. Em 1999 Orhan Pamuk comprou um palacete histórico em Istanbul para realizar um projeto ligado ao romance, encarregando o arquiteto Ihsan Bilgin – antes de começar a escrever o romance - de transformar o prédio em um museu, onde o livro e o próprio museu se cruzassem na história de amor entre Kemal e Füsun, os protagonistas. Depois de nove anos, tanto o romance como o museu nasceram contemporaneamente.

Nas últimas páginas do romance, Pamuk elabora de maneira clara e eficaz uma verdadeira “teoria do museu e das coleções”, oferecendo, inclusive, um mapa para chegar facilmente às suas instalações e dependências, e uma cópia de uma entrada, que todo leitor poderá apresentar para visitar o museu: será um percurso lento, às vezes tedioso, às vezes dará vontade de pular alguma sala e deixar de lado alguma relíquia que nos parece já conhecida. No final, todavia, sairemos do museu com a sensação de ter visitado a vida, que se trata de uma coleção de momentos felizes.

Na foto: o palacete onde foi inaugurado o Museu da inocência.

SEM HUMOR.

Segunda feira, véspera de véspera de feriado. Já fiquei sabendo que meus alunos resolveram boicotar a aula de hoje. Ficaria trabalhando (ou procrastinando meu trabalho) sem ter a angústia de preparar a aula. Mas não, uma pequena parcela deles estará em sala de aula. Então, lá vou eu, me perguntando a razão pela qual os que estarão presentes são masoquistas. E também o que passa pela cabeça dos que resolveram antecipar o feriado. E nesse meu inútil pensar, nada acontece, mais um dia sem sentido se vai e eu continuo parada que nem poste. Meu humor está na altura das canelas, só porque estou de bom humor. Quero somente desaparecer um pouco do mapa. Sei lá, já que não posso tirar férias, dá para me provocar um coma induzido para ter uns dias de descanso?

terça-feira, 4 de outubro de 2011

FEMINISMO & FEMINISMOS



Black Stream é mais um lugar onde pertencer ao sexo feminino já cria desvantagens. Não vamos fingir que uma cidade provinciana do interior represente uma vanguarda nos costumes & nos hábitos das relações de gênero.
Viver no meio de posturas machistas é uma experiência que, em maior ou menor grau, todas as mulheres vivenciam. Machismo é algo que pode ser grosseiramente expresso ou adquirir tonalidades mais sutis, portanto mais difíceis de se enfrentar. O leque da expressão "soft" machista, daquele macho, para ser clara, que gosta de se declarar "não machista", se abre com as piadas sobre as loiras, seguidas com as piadas sobre as feministas quando não demonstramos particular agrado pelas piadas sobre as loiras. Seguem tratamentos que oscilam entre prestar uma atenção distraída ao que se fala, com respostas paternalistas e, em geral, esses machos autoafirmados como "não machistas", te olham e te escutam como se sempre estivessem um degrau acima: sempre com uma certa condescendência. Em geral, demonstram interesse nas tuas palavras somente se neles há alguma forma tesão sexual. Tua cabeça é avaliada como inversamente proporcional ao tamanho da bunda, o fetiche "grande" dos brasileiros.
De tanto passar por isso, se acaba adquirindo uma doença muito comum e infecto contagiosa, a "síndrome de gênero": a eterna incerteza, o eterno ficar na fronteira entre aceitar que você é um modelo e se retrair como "uma boa mulher faz", cedendo o passo aos homens, ficando atrás de
suas figuras... assim, mulheres de destaque, de liderança, habilidades que você, às vezes, parece olhar com perplexidade, como se essas qualidades não lhe pertencessem, acabam sempre em segundo lugar. O problema é que quando damos peso aos chiliques de homens de TPM ou quando cedemos à arrogância de quem se acha poderoso, especialmente perante mulheres, único poder que lhes é dado por uma idéia errada de "natureza" dos gêneros, que vêem como menos poderosas, acabamos nos "reduzindo". Ainda mais se não somos jovens, atraentes e simpáticas. Somente mulheres comuns capazes de pensar não somente nos trilhos daquilo que toda mulher pensa desde criança, mas também naqueles territórios que pertencem à tradição e à linguagem masculina, como a ciência ou a política.
Sempre me é difícil digerir que mulheres capazes, ativas,inteligentes e habilidosas, que já obtiveram reconhecimentos pelas suas atividades acabem deixando papeis de relevância nas mãos dos machos. Que, regularmente, se consideram à altura, e se reconhecem entre si nesse papel. Poucas e importantes são aquelas mulheres que conseguem se salvar de rótulos estereótipos ligados ao feminino. Por isso que gosto da Dilma, diga-se de passagem...

É necessário que haja uma mudança de atitude perante as mulheres jovens que buscam se espelhar, encontrar e reelaborar modelos femininos. Seria interessante que se encontrassem enfrentando o desafio de se tornar mulheres fortes, empoderadas (empowered) e que apresentam resultados de maneira tal que ninguém ousasse mais olha-las com uma certa perplexidade, ponderando quem foi o homem que as colocou lá. Sempre de passagem, diga-se que a Dilma não escapou disso... aqueles que não a queriam, a atacaram alegando que atrás dela havia a figura do Lula. Claro que sim... como atrás do Serra havia o FHC na época de sua disputa contra o próprio Lula... E que eu lembre, não pareceu tão estranho! Enfim, quando se coloca o Lula "atrás" da Dilma, se entende que ela não tem vontade própria e que ela será mera executora das vontades do Lula. Por sorte, a Dilma é, definitivamente, outra coisa respeito à essa idéia. Quer se goste ou não da política atual. Ela deve tornar-se uma figura de referência, um modelo com o qual confrontar-se.

Em uma certa medida devemos nos perguntar como desenvolver esse modelo. Aliás, em termos de "teorias de gênero", essa questão de modelo feminino que abre e mostra caminhos às outras é fundamental, porque raro e marcado por dificuldades, dúvidas e, também, os erros de quem pisa em territórios que nem sempre reconhecem nossas habilidades ou, até, nosso direito de sermos "ambiciosas". Precisamos procurar e nos tornar poderosas "mães simbólicas" para aprendermos!!

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Nunca estudo cientifico foi mais esclarecedor... e meu teclado hoje nao deixa colocar os acentos, portanto farei um post sem acentos. Desculpem meu teclado.
Voltando ao tema: essa imagem circula pele rede e diz tudo sobre as condiçoes de vida em Black Stream. Ontem, finalmente, choveu. Um pouco. Depois parou e hoje vai voltar a fazer muito calor. Semana passada, chegou a 43 graus. Nessas condiçoes, ate pensar fica dificil. E eu preciso escrever. Mas fico naquela de procrestinar. Procrastinar. Procrastinar.
Fim do post de porcrastinaçnao.