quarta-feira, 3 de junho de 2009

HERODES’ FAN CLUB.



Uma vez, no trabalho, pediram doações de brinquedos para as barraquinhas da festa junina da empresa. Me perguntaram se ia participar da festa. Imaginando hordas familiares com alegres criancinhas brincando & gritando & tropeçando, me achei inadequada para tamanha empreitada e disse que, infelizmente, um compromisso religioso me impedia de participar, mas durante meu retiro espiritual dedicaria uma prece para o sucesso da festa.

Mas fui, comprar os brinquedos. Entrei na loja Medéia – tudo por 1.99 e me deleitei no meio de prateleiras cobertas por objetos de plástico:

1) Pacotes com dez cabeças de boneca, de vários tamanhos, todas sem cabelos.

2) Pacotes com torsos de vários tamanhos, todos sem braços, nem pernas, nem cabeças. Que estão na outra prateleira.

3) Pacotes de dez braços direitos de vários tamanhos.

4) Pacotes de dez braços esquerdos de vários tamanhos.

5) Pacotes de dez pernas direitas de vários tamanhos.

6) Pacotes de dez pernas esquerdas de vários tamanhos.

7) Pacotes de fios de naylon colorido em loiro/moreno/ruivo. Para colocar nas cabeças.

Muitas prateleiras. Havia também centenas de: tiaras de latão e plástico brilhante, pulseiras de latão e plástico brilhante, anéis de latão e de plástico brilhante. Ainda, prateleiras de luminárias “étnicas”:

a- Africana. Uma mulher negra com uma/duas crianças de barriga proeminente. Faz parte do ideário sobre África dos produtos Made in China importados via Paraguay. Não dá para levar em uma festa junina. Peitos de fora e crianças, em festa familiar, não combinam. Ainda que se trate de uma mãe etnicamente correta. Os retratos da fome, todavia, são inquietantes.

b- Asiática. Uma geisha de quimono e sombrinha. As geishas não têm filhos nem tetas de fora. Porém, podem parecer um pouco licenciosas, como prêmio em festa junina.

c- Rom. Com semblante de cigana de Notre Dame. Não se parece com as Rom das periferias italianas, as nômades sujas e maltrapilhas que agarram tua mão para grudar infaustos destinos em tua cabeça. Na época dos antigos romanos, descobri, essa atividade era típica de jovem moças judias. Os Rom não ficam bem em festas com crianças: conta a lenda que as roubam. As crianças, digo. Então, Esmeralda fica na prateleira.

As outras etnias faltam na loja Medeia. Talvez uma mãe judia por 1.99 não se encontre facilmente.

Encontro, finalmente, as prateleiras de brinquedos. Todos rigorosamente sem selo Inmetro. Têm pacotes de tanques, de carrinhos, de bonequinhas minúsculas. Todos os brinquedinhos apresentam partes que podem furar os olhos; que podem ser ingeridas; que podem provocar danos. Alguns brinquedos, como aqueles potes de meleca verde víscida, contém substâncias tóxicas.

Perfeito.

Compro cinco brinquedos: um pacote de tanques minúsculos e com a ponta do canhão quase afiada; uma arma de plástico; um set de chá para bonecas com pratinhos pequeninhos. Um arco com flechas; a reprodução de um tubarão verde. SIC!

No dia seguinte, entrego minhas doações. Suspiro e sorrio, dizendo que pena, não poder vir, deve ser gostoso! Penso que é muito legal, ser membro do Herodes fan clube.


2 comentários:

  1. Prezada Fada de Preto:
    Nessas ocasiões fatídicas, envolvendo petizes e ações beneméritas, um recurso muito útil são os brinquedos educativos, que lhe proporcionam o benefício colateral (meio duvidoso) de ser considerada uma pessoa "consciente". Algumas sugestões:
    1-) Atlas criativo: baseado (ops) nas propostas construtivistas que propõe formar um indivíduo-agente-de-seu-próprio-conhecimento (ou algo parecido, dormi no meio da explicação ...), esse lindo atlas traz um mapinha que pode ser montado de acordo com o gosto do(a) pequeno(a) petiz. Nas versões Superclass (com cinco Suiças), Midlle Class (com três Paraguais e duas Miamis) e Whitout Class (com três Maranhões e dois Congos).
    2-) Pequena Maysa: deixe sua filha (ou filho, não vá reprimir sexualmente o garoto!)transformar-se numa comunicadora de TV, trabalhando muito, vendendo produtos culturais para o resto da criançada e trazendo dindin para a mamãe e o papi! De brinde, junto com o kit, um idiota que imita o Silvio Santos para estimular sua pequena artista!
    3-)Kit "Fabriquinha Feliz": ensine aos pequeninos o valor do trabalho. Ajude-os a moldar o caráter. Nesse lindo brinquedo educativo, não-tóxico e fisicamente estimulante, ele vai aprender a fabricar o próprio tênis (o que, de quebra, te proporcionará uma grande economia, além de evitar pagar o mico no shopping). Grátis, com o kit e a linha de montagem, 12 amiguinhos indonésios para brincarem junto com sua criança!

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  2. Estimado Marco,
    Tamanha devoção para com as crianças merece um prêmio: fui, portanto realizar contatos com patrocinadores capazes de oferecer algo valioso e único a seus cuidados educacionais: o prêmio "Pedagogo de Couro", pois o ouro era caro de mais, e uma viagem de ida sem volta no vôo Lost 666, com destino, dentro do país, ao Rio Grande do sul, na pousada/spa
    CASA DE M'BORORÉ. Essa estância turística localiza-se na área das Missões, e tenho certeza de que a viagem prêmio irá agrada-la, pois ela permitirá que o senhor participe da caça ao tesouro dos jesuítas. É noto, com efeito, que os jesuítas acumularam uma fortuna imensa, uma verdadeira Eldorado cristã. Quando foram obrigados a abandonar suas terras, esconderam seus tesouros nos penhascos, nas grutas e nas fendas do terreno na região, mas os hóspedes da estância podem explorar a área e seus poços, subterrâneos, casas e torres, onde certamente encontra-se o ouro, as pedrarias, as moedas, as pratas e as armas fabulosas. Com um pouco de sorte, enveredando pelo justo caminho durante seus passeio & devaneios,o senhor poderá aproveitar as águas da Fonte da Eterna Juventude.
    A CASA DE M'BORORÉ é uma pousada branca com detalhes arquitetônicos modernistas e funcionalistas já desde essa época. É um casarão ermo, caiado, escondido, plantado numa lombada. A casa, sem portas nem janelas, está repleta de barras de ouro, de prata, em pilhas e montes.
    Marco, essa viagem fascinante é sua, com direito a acompanhante, pela sua colaboração no intuito de melhorar as perspectivas de emprego dos nossos pequenos adultos...
    Durante sua estadia, ainda poderá desfrutar do espetáculo do coral "Os Bradadores" que acompanharão suas noites com as notas de "Oh, yes, banshees love bananas too!".

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