sexta-feira, 25 de junho de 2010

BIOGRAFIAS IMPOSSÍVEIS II: IRREVERENTE LIVRE

Foto de casamento das duas Irreverentes.

A senhorita Irreverente Livre reside na Rua do Joelho 12, ao lado da cadeia da cidade famosa por suas três Ts de Tetas, Torres e Tapioca.

Irreverente é a primeira T, a de Tetas, sem dúvidas. Exuberante, revela esse seu elemento enlevando-o através de abismos vertiginosos de decotes marcantes, regatas restritas que não restringem muito. Irreverente, para dizer a verdade, não gosta muito de sua T, pois quando ela entra, antes dela entra sua T. Irreverente, desde criança, espiava pelas janelas da Rua do Joelho 12 suspirando, se perguntando como abrir, aliás, escancarar os portões da cadeia, que ela chamava de Castelo do Marisco, lugar que imaginava feito como as masmorras da magnífica residência de uma bruxa poderosa, e pensava que um dia teria derrotado a bruxa e a substituiria, poderosa e dominadora. Enfim, queria descobrir os Mistérios do Marisco. Tanto trovão trouxe chuva, e também tanto foi a gata até a banha que acabou perdendo uma pata, encontrou, a jovem, livre, o caminho para este conhecimento e, finalmente presa, em seguida a posturas um pouco excessivas (leia-se: tumultos graves no estádio durante os jogos de seu time do coração), conseguiu, finalmente, libertar toda sua irreverência entre as estreitas paredes de uma cela comum. Conta Irreverente que a excitante experiência a encheu de felicidade, pois conseguiu, finalmente, encontrar Figuras Interessantes, ladras e prostitutas, trombadinhas e traficantes, ampliando, assim, o panorama de suas possibilidades. Irreverente nunca teve dúvidas: o mundo de liberdade atrás das grades é, decididamente, muito mais interessante de tudo que, até então, encontrara. Por isso, visto que sua permanência nas cadeia nacional durou somente poucas horas, daquele dia em diante ela se esforça, com grande seriedade & afinco, para reencontrar o caminho daquela que considera sua verdadeira residencia, a cadeia do Marisco, onde um dia poderá afirmar que é Livre, ainda que tenha, para isso, renunciar a ser Irreverente.

Para tanto, muito se empenha: lá, onde as brigas são mais ásperas, lá, no parapeito da curva, a gritar até explodir as veias do pescoço, lá, onde os Paraísos Artificiais se encontram na escuridão – e, às vezes, à luz do sol – eis que Irreverente caminha, tranquila e seráfica, consciente de sua força, da direção a ser dada à sua vida. Dominará o grande castelo do Marisco, ainda que dificuldades e obstáculos pareçam insuperáveis. Enfim, não é facílimo, quando os Inimigos, as Forças da Ordem se opõem, proibindo-a de entrar no lugar mais amado, no lugar onde pode ser si mesma, libertando a força selvagem que guarda dentro: o estádio é a ela proibido, e não tem graça em entrar no Marisco enquanto desobediente pura e simples, aqui precisa de algo grande, algo que demonstre sua potencia, não um malfeito corriqueiro!

Irreverente realizou um monte de coisas belíssimas, em sua vida, é uma Esplendorosa Pessoa, chia de idéias e atividades. Por exemplo, um dia resolveu montar um time. De futebol? Não. De vôlei ? Não. De Basquete? Que nada! De futebol americano, um esporte leve e delicado, time para o qual convidou várias donzelas leves e delicadas, que desejavam correr como ninfas entre os bosques, enfrentando os adversários como se fossem Sátiros Vulgares a serem eliminados. O time não podia que se nomear As Megeras. Infelizmente, elas ganhavam tanto, mas tanto que, no final da primeira rodada os outros times recusaram-se em investir seus patrocínos em esparadrapos e colares de gesso. Assi, as Megeras ganhavam sem jogar, por abandono do adversário. Jogar virou um grande tédio e o time se extinguiu. Ma Irreverente, todavia, decidiu que os vestígios de tudo isso deveriam permanecer como eterna memória, tanto que, ainda hoje, todos os anos, convoca as sobreviventes companheiras de time para uma grande festa. Na verdade, poucas são as supérstites nas cruéis andanças da vida. Parte sucumbiu às múltiplas maternidades, outra aos Poderosos Maridos Impotentes, ou às Namoradas Extremamente Dolorosas, tanto que o número que sobrou é tão pequeno que na festa anual das Megeras vai um monte de gente que não tem nada a ver. Ainda assim, é sempre um momento de encontro mágico, apesar do fato de a lembrança das Megeras ter que ser tomado emprestado pelos hóspedes por algumas horas.

Irreverente é viúva, de um casamento de Amor. Sempre aquele com A maiúscula, mas dessa vez de origem visceral, aquele Amor que chacoalha a alma, as entranhas e a genitália. Casou, contra a vontade do mundo inteiro, mas com o apoio de amigas leais e da família, com Irreverente Lutadora. Sim, eram as duas Irreverentes, homônimas, iguáis e contrarias: Irreverente Livre, loira, extrovertida, de esquerda, Irreverente Lutadora, morena, introvertida e declaradamente de direita. Yin e Yang total, saíram à conquista do mundo, o Marisco, mas o Marisco era fortificado, ainda não amadurecera o tempo, as estrelas não se encontravam corretamente alinhadas, e enquanto esperavam o melhor momento, se dedicavam à construção de outros Paraísos Domésticos: a casa delas se tornou um acolhedor Buraco Negro, onde todos que entravam não encontravam nem a maneira nem, principalmente, uma motivação para sair. Irreverentes e Felizes, confundidas uma na outra em um abraço decididamente resistente, duras e tenras, excessivas, amadas e admiradas, criavam sempre um arrepio, um frisson por onde passavam. Ou, quanto menos, uma certa Perplexidade, mas nunca sua passagem deixava as coisas como estavam. Mas, mas, porém, porém, um dia, Irreverente Lutadora deitou entre os vasos de flores e disse: “Meu amor, está hora de eu deixar o Buraco Negro para sempre, pois a luz é um fenômeno que merece um estudo aprofundado. Sei que vou deixar um Buraco Profundo, mas o que deve acontecer, acontece, e nossos trilhos cruzados devem encontrar um cruzamento diverso”, fechou os olhos e um bando de faisões no jardim lhe levou embora o respiro. Grande foi a dor de Irreverente Livre, uma tristeza Território infinito sem fronteiras tomou conta dela, perdera metade da Irreverência, sua doce metade, mas como se trata de uma mulher de fibra, agarrou um regador e começou a recolher as lagrimas para regar gerações e gerações de orquídias exóticas e brilhantes. Eis, agora que vocês encontraram toda essa Irreverência, saibam que sua existência é de Fundamental Importância para quem é do bem e, talvez, também para quem é do mal.


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